segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Dia 7039 de viagem, fim de tarde em Istambul

Dia 7039 de viagem, fim de tarde em Istambul

Vagueio sozinha pelas ruas de Istambul, apenas eu e a minha sombra. Sozinha, ou deverei dizer acompanhada de mim? Os meus pais já estão, provavelmente, em casa com os meus irmãos mas eu pertenço às ruas, permaneço nelas. Sigo o caminho para casa. Perco-me e encontro-me em cada esquina, em cada gesto, em cada rosto. Detenho-me. Detenho-me na luz que cai sobre Istambul, neste fim de tarde, cai e cobre todo aquele lugar... por entre mesquitas, palácios e pela manga de ouro. Principalmente sobre esta. Já não vejo o sol, mas a sua luz ainda colori o céu. E eu que ando perdida entre gestos, olhares e pessoas na rua, eu, que tanto gosto de pormenores, detenho na imensidão da paisagem, da água, da luz. Devia seguir o caminho, mas o meu corpo não se move, apenas as mãos tem movimentos esquizofrénicos para registar o momento. Mas é impossível, logo eu que odeio essa palavra.
Foi a primeira suspensão. Mal o ar volta a circular, o ritmo cardiaco a estabilizar, uma tempestade de pensamentos invade a minha alma. Um remoinho de ideias, desejos e pessoas. Algo sai disparado, quase como cuspido desse remoinho. És tu. Apenas tu.
Letras e palavras recaem em mim, como se estivesse a escrever num postal para te mandar, apenas sobre aquela luz. Mas não escrevo, estou apenas parada, sem andar. Quero chegar a casa para escrever tudo isto num postal, que ainda não comprei. Escrever a tua morada para que uma recordação rastejante voe até à tua caixa de correio.


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Dia 7036 de viagens, entre as talhas douradas do Bósforo

Bem cedo, na desportiva
Levou-me o vento azul do Bósforo
Enrolando-se em talhas douradas
Entre pinturas de mísicas cores

Cores que tingem o meu pensamento,
Enquanto o sol forte me envolve.

Regresso ao ninho volante.
Transportada pelo vento do Bósforo
Que agora se derrete em tons de laranja.
Sobre as antigas casas vermelhas,
Que por serem de madeira
Desvendam alegremente as florestas.

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Dia 7035 de viagem, perdida no mais fundo dos azulejos

Rastegei por entre azuis
Vermelhos e esverdeados.
Mas os meus olhos inconscientemente
Mergulharam no ciano que
Escorria para as pérolas e esmeraldas.
O perfume, esse começou leve
E doce, com pezinhos de lã
Como quem quer passar despercebido
Mas pouca dura essa leveza
Vingam dos intensos do ar.
Lutando pelo nariz turístico
Que não regateando
Leva-o pela maior moeda.
E mesmo antes do sono
Mergulho novamente
Nos padrões e tulipas,
Que enchem todo o dia.
Conto minha cabeça com eles
Para que o descanso
Se resguarde numa
Mesquita.

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Dia 7034 de viagem, terras turcas...

Luzes cintilavam pelos meus cabelos
Sem que o olhar se pudesse distinguir
Reflectia-se no sorriso infantil,
Que com uma espingarda na mão
Rebentava um a um cada balão
Cujos restos mortais o Bósforo levava.
Como outro inocente corpo corrida
Para os braços de uma provável mãe
Que mais do que olhos de erva eu não vi,
Emoldurados em todos aqueles padrões.
Pelas ruas que vagueava
Como turcos gatos
Perdidos, mas sem medo,
Como se o mundo lhes pertencesse.
Revia-me no olhar da mulher
Que subindo um escadote de madeira,
Por entre as ruínas se acolhia
Aquilo a que chamava casa.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Dia 7033 de viagem, num avião de papel

Pedi a um pequeno rapaz
Um avião de papel,
Ele deu-me um bem pequenino.
Coloriu-o com o olhar
Iluminando o novo dia.
No seu sorriso envergonhado,
Que misturava a desconfiança e o mistério,
Estendeu-me as suas leves mãos
E entre os dedos reluzia um avião de papel.
Aparentemente, feito com papel de embrulho,
Da prenda do pai natal, digo eu.
Mas não, tinha apenas sido com o olhar,
De um pequeno sorriso envergonhado,
Que ainda sabia sentir.
Foi assim que comecei a voar...
Escorreguei pelo por do sol,
Conheci estrelas pequenas
Deslizei até turcas terras

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Dia 6994 de viagem, no cais para além do navio.

Dia 6994 de viagem, no cais para além do navio.

Não imaginam marinheiros o quão estranho é ver um barco no qual navegamos durante mais de 15 anos partir, e não estar a remar lá dentro. Ver uma família, que em tempos foi minha, não, que ainda é minha, a velejar sem mim. E eu parada no cais. Apenas olho pelos olhos transparentes da saudade, que aos poucos deixam escorrer um pouco da transparência, enquanto numa distancia indefinida, de tão perto parece tão distante, uma onda se desenrola livremente. 

Vejo o movimento do barco, e parece que ele está em mim, que faz parte do meu ADN mas na verdade estou parada no cais, simplesmente parada, a olhar… todos os passos e movimentos foram quase que esculpidos em mim, e eu sinto-os por dentro, sem os poder expulsar e atirar…

E mais não digo, porque as palavras escorregam-me pelo olhar...

terça-feira, 26 de maio de 2015

Dia 6943 de viagem. sem ar.

Dia 6943 de viagem. sem ar.

Marinheiros, 
Estou sem ar, estou sem ar para respirar! O ar extinguiu-se ou talvez seja apenas eu a não o conseguir respirar, tento come-lo, num longo gesticular do maxilar, como quem tenta dar um dentada numa sandes gigante. Mas é em vão, continuo sem ar. Não há ar. Como posso navegar? Sem ar? Apreço os remos como quem corre À procura do ar. Mas quanto mais corro, mais ar preciso e menos existe. Se algum souber a receita do ar, que a envie pelas ondas do mar. enquanto eu tento sobreviver sem ar às ondas que atormentam os meus marinheiros.
As ondas andam atribuladas e barulhentas, porém de longe só se ouve o frio silêncio, e a verdade é que preciso da textura do silêncio, mas os sussurros distantes são necessários para a força dos tripulantes.

Abraços marinheiros!




P.S.: Não eu não sou comandante, sou a marinheira mais frágil e fraca do meu próprio barco.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Dia 6938 de viagem, algures entre a saudade e o esquecimento.

Dia 6938 de viagem, algures entre a saudade e o esquecimento.

Boa tarde Marinheiros,
Como há muitos anos digo, o meu maior medo é do “esquecimento”. Tenho medo de me esquecer de momentos, pessoas, vivências e mesmo que seja um pouco egocêntrico tenho medo de ser esquecida. Não eu não quero que todo o mundo se lembre de mim eternamente, nem por aquilo que sou nem por aquilo que faço, só gostava que certos marinheiros se lembrassem de mim, só aqueles em quem eu penso diariamente, e que estando perto ou longe penso todos os dias, e com vontade de os abraçar. A verdade é que hoje apercebi-me de vez que já fui esquecida por alguns dos marinheiros mais importantes para mim. Não só fui esquecida com fui substituída por muitos outros, provavelmente melhores, certamente melhores, mas infelizmente essa ideia só faz com que doa mais. Talvez fosse melhor eu não ter medo do esquecimento, e ser mais esquecida do que os outros, assim não sofreria tanto ao ver que fui esquecida.
O que é que eu fiz para ter de ser esquecida? Simplesmente pus-me a caminho e comecei a navegar, e uns meses depois já não sou mais do que uma conhecida para muitos dos marinheiros com quem partilhei quase tudo, parece que já não os conheço, e eles arranjaram quem os conhecesse melhor. Gostava que isto não doesse, mas não consigo evitar, tento não pensar e talvez esquecer-me, tento inventar outras historias e justificações, tento enganar-me, mas já não serve de mais nada. Passaram-se 8 meses de viagem desde que parti, e já sou um objecto estranho no meu lugar. Como será daqui a 2 ou 3 anos? Se calhar o melhor é esquecer as origens, e algumas das pessoas que mais importam na minha vida, e tentar, tentar simplesmente começar do zero, não ser ninguém, em lado nenhum. Caminhar por entre ruas desertas, ou ruas povoadas com seres insensíveis a mim, ser isoladamente, e não ser. Talvez não ser, porque se nada sou para os outros, porque irei tentar ser para mim mesma? 
Será é o facto de eu só ser para mim que me torna tão egocêntrica… talvez se eu escolher não ser, será melhor para o mundo.
Porque é que existe a distância? Porquê a saudade? E acreditem Marinheiros, a saudade dói mais quando só é sentida de um dos lados.
Porque o tempo é escasso e é necessário segurar o barco para que não vire, deixo-vos um poema que escrevi à cerca de 2 anos, mas que continua a ser tão real:

A saudade come-nos vivos,
Mata-nos aos poucos,
Corroí os nossos  corações,
Até destrói os corações de pedra.
Não conseguimos ser imunes a essa dor,
Não conseguimos ser duros
Com este sentimento sempre a empurrar-nos
Para um poço de tristeza.
Entramos assim em desespero,
Porque ainda não aprendemos a sair dali.

A saudade é o espelho transparente do amor,
Que pela distância, escorre, involuntariamente pelos olhos. 

Com saudades,

não ser, talvez

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Dia 6909 de viagem, praias indefinidas, ou será mares indefinidos, já nem sei.

Dia 6909 de viagem, praias indefinidas, ou será mares indefinidos, já nem sei.

Boa noite Marinheiros,

Acho que estou meia perdida entre quem fui, quem sou, quem serei e aquilo que quero ser. E sendo todas elas tão diferentes são tão indefinidas, porque elas são eu, mas não são aquilo que eu sou. Na verdade, elas sendo eu são aquilo que eu não sou.

Quanto mais me procuro mais me perco e quando me tento definir aprendo o significado de impossível. Sou o inexistente que existe e passo o tempo a explicar o inexplicável.

Continuação de boas viagens.
Da vossa marinheira,

alguém (ou talvez não)

domingo, 19 de abril de 2015

Dia 6907 de viagem, num lugar vazio, em lugar nenhum.

Dia 6907 de viagem, num lugar vazio, em lugar nenhum.

Há dias que parecem eternos e infinitos, que numa mais acabam, mas na verdade são vazios. Completamente vazios, sem nada que os torne especiais. Nem normais sequer se conseguem tornar. A viagem parece suspensa, e não há sequer forças para remar. fico imóvel, olhando em redor, tentando perceber o porquê das coisas. O porquê do barulho do mar, o porquê do meu estancamento. Estou flutuando no mar, e não há correntes, sinto-me nostálgica mesmo sem qualquer tipo de nuvem no céu. Não há sequer vento batendo nas velas, estou apenas parada, num dia que não passa. Sinto-me sem motivos, sem existência, não sou nem estou em lado nenhum. Estou surda, e apenas vejo o silêncio do mar na sua imensidão. O mar está deserto não há nada para além de mim no meu horizonte. Não há nada, nem praias, nem rochas, nem ondas, nem barcos, nem vento, talvez nem eu haja.
Sinto o dia vazio, sinto-me vazia…


Hoje escrevo aqui, um dia escreverei na areia, para que o mar leve as minhas palavras para o lugar onde eu nunca fui….

terça-feira, 14 de abril de 2015

Dia 6902 de viagem, Lisboa suponho.

Dia 6902 de viagem, Lisboa suponho.

Desculpem marinheiros por fazer tanto tempo que não escrevo.

Por vezes o acto de escrever é imediato. Mal algo acontece há em nós uma necessidade de o transmitir por palavras escritas em papel ou num qualquer ecrã. Outras vezes é necessário dar um tempo, respirar. Deixar que tudo se interiorize, para poder escrever ou talvez não. Talvez não queira escrever queira apenas ter vivido.


Na verdade dias estranhos, sem vontade de os comentar.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Dia qualquer coisa de viagem, qualquer lugar.

Dia qualquer coisa de viagem, qualquer lugar.
Há dias em que simplesmente parece que não existo, será que esses dias deverão contar para os dias de viagem?

terça-feira, 10 de março de 2015

Dia 6883 de viagem, num mar qualquer com reflexos de por-do-sol.

Dia 6883 de viagem, num mar qualquer com reflexos de pôr-do-sol.

Desculpem marinheiros, passei demasiado tempo sem escrever, mas mesmo hoje não sei o que dizer. A viagem está feliz, mas estranha. O tempo ameno. Apesar da grande nuvem cinzenta que nos assombra, o sol ainda brilha com força. Brilha de manha ao fim do dia, momento em que o mar se torna laranja e as aguas calmas, provavelmente com sono dos tantos barcos que por elas navegam.

Não se ouve,… apenas as pequenas ondas a bater no barco, e algumas vozes de marinheiros distantes.
Há demasiado a acontecer, o destino e o rumo permanecem nulos. Existe apenas, um desejo de reação, não minha, mas de uma outra marinheira.
Não consigo definir o meu estado (anestesiada? Talvez), ou o do navio. A viagem anda simplesmente estranha. E rápida, talvez.
Tenho reencontrado marinheiros de outras navegações. Algumas longas, outras pequenas, talvez um dia a história dessas navegações seja maior, mas por enquanto são apenas vários encontros e desencontros.

Ah! Sempre desejei poder colocar um pôr-do-sol no papel, ou mandá-lo a alguém. Sempre quis ter o poder de o levar comigo. Ou de o saber descrever. Mas a sua beleza é inatingível e a sua singularidade me afasta dele. Nem desenhos, nem pinturas, nem sequer fotografias o conseguem captar na sua plenitude. E palavras? Não há palavras suficiente para isso. Não há palavras suficientes para descrever as suas cores e reflexos. É por isso que há muito tempo que desejo o poder de o alcançar, e não apenas de o observar majestosamente.

Oh, desculpem, devia falar da navegação, mas fiquei perplexa com o momento. No barco anda tudo estranho, mas não quero dizer que anda infeliz. Gostava apenas de mandar esta nuvem para longe. E claro de não ser invisível para alguns antigos marinheiros! Se calhar é possível descativar alguém, e deixar  de ser uma necessidade para o outro e de ter necessidade do outro.

Não sei que mais dizer, peço desculpa pela intermitência.
Boas viagens!

domingo, 1 de março de 2015

Dia 6867 de viagem, entra as aguas e a terra.


Dia 6867 de viagem, entra as aguas e a terra.

Há muito que não escrevia nada, e hoje saiu isto, e partilho de forma completamente crua, tal e qual como a conheci.

Encontro-me entre a água e a terra.
Uma musica ressoa em meu redor,
Sem letra (mas não precisa dela)
Uma guitarra solitária, que
ecoa com as ondas de um rio
aspirante a ser mar. Ou
talvez oceano, quem sabe.
As palavras desvanecem-se
por entre o dedilhado da guitarra
E eu procuro a força, a garra.
Procuro aquilo que posso dar ao
mundo. Procuro-me.

Os reflexos de luz ensurdecem o ar
Mas a musica permanece,
é eterna novidade, às vezes.
Mas, por vezes identifico-a!

Todas as pessoas desapareceram. 
Talvez ainda esteja aqui o guitarrista.
Mas, não quero olhar para trás.

Cada vez há mais luzes na outra 
Margem, os reflexos multiplicam-se
E o meu barco transparente
continua `s minha espera.
Um barco simples, talvez
imaterial para os outros. 
Mas é vida para mim



Saudações marinheiros!

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Dia 6863 de viagem, num mar de medo egoísta e esperança disfarçada.

Dia 6863 de viagem, num mar de medo egoísta e esperança disfarçada.
A vida consegue ser mesmo efémera, e por vezes esquecemo-nos disso, Não aproveitamos todos os segundos para conhecer os outros, os que nos rodeiam, não aproveitamos todas as oportunidades que temos para estar com alguém. Mas, por vezes, ma ventania dá cabo de nós, e percebemos que poderemos nunca mais poder ver alguém. Não que isso seja certo, mas apenas porque um acontecimento nos fez pensar nisto. Na verdade, essa possibilidade já existia desde o nosso último adeus. 
Por vezes de um momento para o outro tudo mudou, mas para nós, para aqueles que não estavam nesse momento, esse momento pode ser uma semana, um mês, ou mesmo um ano depois. Esse momento tardio é que muda a nossa vida, esse momento é aquele em que passamos a saber o que aconteceu. A distancia entre esses dois momentos é a nossa ilusão e ignorância, nessa distancia nos ainda não nos preocupamos porque apesar de ter acontecido, nos ainda não temos consciência disso.
Custa-me a acreditar que algo tão injusto possa ter acontecido. Não, não a conheço assim tão bem, na verdade apenas passei uma pequena parte da minha vida com ela, mas cada vez me aperta mais o medo de não a poder conhecer. Cada vez fico mais dividida entre a certeza de a poder voltar a encontrar, de que tudo ficara bem, e o medo, porque não posso chamar outra coisa, e o medo de não a poder voltar a ver, e conhecer melhor tal rapariga que sempre me soou fantástica.
E isto tudo parece tão egoísta e egocêntrico. Eu não posso mudar nada, sou inútil. E fico aqui a pensar na efemiridade da vida, e mesmo que não queira, na verdade, não estou a pensar em qualquer vida estou a pensar na minha e um pouco nas que conheço. Não penso naquelas que existem no outro lado do mundo e que apesar de saber, e de por vezes ter vontade de as melhorar, me passam rasteiras ao pensamento. Não penso no vizinho da frente que nunca vi, não sei sequer se a vida dele ainda existe ou não.
Estou aqui a pensar na minha vida, na possibilidade de ela acabar de um momento para o outro. Estou a pensar no arrependimento que vou sentir se não puder voltar a falar-lhe, e no medo que tenho de isso acontecer.
No fundo, por trás de todo o medo egoísta resta-me acreditar que tudo irá ficar bem. Apesar de não a conhecer super bem, considero-a alguém que merece bastante atenção para se conhecer o seu grande valor, e gostava de cumprir com o tal prometido café em Lisboa.
Força a todos os marinheiros, principalmente ao que são próximos desta. E claro, muita força a esta marinheira especial que espero que volte a navegar, para nos encornarmos em alto mar.

Saudades de marinheira.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Dia 6852 de viagem, no vazio.

Dia 6852 de viagem, no vazio.

Boa noite Marinheiros,

Não quero dizer que esteja a correr mal ou bem por causa da tempestade, acho que o problema é mesmo o vazio. Não estou mal. Mas também não estou bem. Porque não é nada. É vazio o espaço. De tão vazio nem espaço tem para algo acontecer. É apenas e nada mais que vazio. Não me leva a nada, nada muda. Permanece tudo igual, tristemente igual. Reme para onde reme, nada muda. É tudo infinitamente vazio. E neste momento eu preciso de um finito, preciso de algo. Estou naquele espaço depois de uma tempestade em que não é nada. Quando esse espaço dura pouco, quase nem nos apercebemos dele. Mas quando ele continua permanentemente rodopiando em nós, torna-se terrível. Chegamos ao ponto de querer voltar à tempestade, porque pelo menos tínhamos algo para lutar, nem que fosse para sair dela. Aqui, não temos nada para lutar, não temos nada que fazer, observamos o vazio que nada nos diz. Observamos tudo de fora, como se nada nos atingi-se nem fizéssemos parte de nada. Mas a verdade é que tudo nos toca, e é capaz de nos magoar. Mas como estamos de fora, distantes, do outro lado, ninguém vê o que nos toca, ninguém vê o que sofremos. E se não estamos mal, pensam eles, temos de estar bem. Esquecem-se sempre que há o espaço onde o nada acontece e o vazio existe. Deixamos de ser e estar. Para que a nuvem inexistente caia sobre nós, e mesmo sem existir, nos afecte por dentro.

Neste ponto é quando temos de aprender a viver outra vez. Fica a duvida: Será melhor esquecer os outros mares? E tentar viver apenas num?

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Dia 6846, mar/barco, lugar indefinido.

Dia 6846, mar/barco, lugar indefinido.

Passo o tempo com saudade de um barco, mas quando passo por ele, parece que nunca está igual. Ou simplesmente eu não estou igual e já não tenho o mesmo espaço nesse barco. Como se na verdade, quando volto, não chegasse a entrar, fica-se apenas a observar de mais perto.Como se houvesse algo a separar-me dos marinheiros, como se tudo aquilo fosse estranho para mim. E vivi eu na ilusão de ter dois barcos, onde teria o meu espaço onde me sentiria em casa, e na verdade não tenho nenhum deles. Apenas os observo, mas já não vivo em nenhum, já não sei se posso chamar casa a algum. Fico como que paralisada, transparente, perdida. 

Saio sempre de um barco ansiosa por chegar a outro, mas cada vez esse outro me é menos familiar, e não sei o que mudou, não sei o que mudar, agora, se calhar fui apenas eu. 

Caminho para um espaço indefinido onde possa viver, ou pelo menos tentar viver. Tudo é indefinido aqui, agora. E tanto me sinto em casa, como os meus como sinto que já não são meus. Já não faço parte daqui.


Cumprimentos Marinhos!

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Dia 6843 de viagem, o lugar não importa.

Dia 6843 de viagem, o lugar não importa.


Por vezes pergunto-me roque sou eu que escrevo sobre a viagem, porque sou eu que escrevo sobre o barco e sobre a navegação, se na verdade sou tão inútil para ela?


(Por vezes surpreende-me como acaba sempre tudo bem. Mesmo quando alguém me magoa ou me desiludi, isso é indiferente, porque ela nem vai sentir, vai tentar desculpar-se com qualquer coisa, eu irei respirar fundo e dizer “Na boa, não faz mal!”. E tudo fica bem até eu voltar a cair, e isto se repetir, vezes sem conta.)

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Dia 6841 de viagem, num semi-mar.

Dia 6841 de viagem, num semi-mar.

Marinheiros, tenho-vos a dizer que tudo o que sou e faço fica sempre por metade. Estou metade neste grupo, sou mais ou menos participante naquilo, sou quase aquilo. No fundo resumo-me a uma palavra “semi”. Ou terei de dizer “semi-resumo-me”? 
Gostava de seguir o nosso génio, na voz de Ricardo Reis: 
Para ser grande, sê inteiro: nada 
          Teu exagera ou exclui. 

Sê todo em cada coisa. Põe quanto és 
          No mínimo que fazes. 

Assim em cada lago a lua toda 
          Brilha, porque alta vive. “

Mas não acontece porque sou sempre metade de mim. Se calhar o meu “inteiro” é apenas uma metade. Gostava de puder ser inteira em algo, mas fico-me sempre na metade.
Eu semi-sou, semi-faço, semi-existo. E isto, Marinheiros, assusta-me bastante!

Espero que vocês não tenham em vós “semis”.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Dia 6840 de viagem não digo perdida, mas certamente parece.

Dia 6840 de viagem não digo perdida, mas certamente parece.

Existem pessoas especiais que por vezes nem tempo temos de admirar. O tempo voa a nossa frente e não sei que caminho seguir agora. Mas parei 5min e apercebi-me o quanto às vezes sou injusta. Sempre tive a vida dividida em pequenas partes, mas agora essas pequenas partes arrastaram-se para uma metade do dia a dia, e uma outra parte caiu de repente e empurrou as pequenas partes para a tal metade. Dei por mim agora, ao ver que essas duas vidas lutam dentro de mim, como as pequenas partes lutavam mas estas exigem mais tempo, tem mais pessoas incluídas, e me deixam a tremer.  Sinto que ao tentar manter as duas, estou a perde-las, principalmente a mais antiga. Sinto-a cada vez mais distante e temo mesmo que me fuja da mão antes de eu conseguir agarra-la. Ela já deve ter caído de mais e eu mal me apercebi. Estou paralisada nada consigo fazer para a agarrar. 
Sei que este texto nem sentido tem, e peço desculpa,… Mas imaginem-se no meu lugar: Sentir que estão a perder aquilo que demoraram 18 anos a construir. Para alguns isto deve ser só parvo. 18 anos para alguns não é nada, ou quase nada, mas para mim é uma vida.

Desculpem a confusão, Marinheiros!




Sinto-me sozinha no barco! Apesar de ouvir tantas vozes tantos risos, e até de ver tanta gente, sinto-e simplesmente sozinha… Não sei o que fazer, não há nada que me faça sentir menos sozinha.tudo o que eu faço está errado, o que eu decido, e principalmente as decisões as quais mais me dedico, levam sempre a um mau porto, isto quando o barco não se destrói antes de lá chegar.o combustível do barco já acabou, e agora estou sozinha a remar. Mas as minhas forças já são poucas, preciso de parar e de encontrar as pessoas e não apenas corpos.

Isto de pegar 3 vezes no diário de bordo para escrever dá nisto.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Dia 6838 de viagem, no mar quase no oceano.

Dia 6838 de viagem, no mar quase no oceano.

Olá marinheiros,
Sinto-me a perder as duas vidas que tinha. Já não faz qualquer tipo de sentido a minha existência, porque é apenas isso, existência. Só há vazio. Não há tempestade, mas também não há sol. Não há nada no vazio.

A dislexia está cada vez maior, custa um pouco a escrever. Penso, mas não escrevo o que quero.

Um dia irei recompensar-vos.


Agora o meu desejo é viajar!

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Dia 6835 de vigem, em Lisboa, talvez.

Dia 6835 de vigem, em Lisboa, talvez.

Sei que ainda agora começou o dia, mas tinha de partilhar o pensamento repentino.

Já se aperceberam que aquilo que nós mais conhecemos somos nós, é na verdade não fazemos a mínima ideia de quem somos?

Vou voltar ao trabalho, o barco espera-me.
Até breve,
Catarina, talvez.


domingo, 1 de fevereiro de 2015

Dia 6833 de viagem, num barco novo, que mantém quase tudo do antigo.

Dia 6833 de viagem, num barco novo, que mantém quase tudo do antigo.

Apenas vos queria deixar uma frase de Charles Sanders Peirce: “Entra em teu barco do devaneio, desatraca no lago de pensamento, e deixa o sopro do firmamento encher tua vela. Com teus olhos abertos, acorda para o que está à volta ou dentro de ti, e abre conversa contigo mesmo; pois assim é toda meditação”

Espero que estejam bem, um destes dias volto ao mundo!




quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Dia 6830 de viagem, no mar que não me permite ser.

Dia 6830 de viagem, no mar que não me permite ser.

Bom dia marinheiros,

Será impossível esta sensação? Sentir que deixamos imensos barcos, imensos tripulantes, imensas aguas em deferimento de uma coisa só, algo que podia ser um sonho, mas que na verdade não é nem nunca foi, um único caminho, que não permite afluentes, e os que tem destrói. Um caminho, que nem sabemos se será o nosso. Um só lugar um só estado que não nos permite viver para além do barco. Um caminho que não permite velas nem lemes, nem outro tipo de tecnologias. Um caminho em que as mãos remam, em contacto directo com as águas. 

Já não existe mais do que este caminho, já não há viva, perdeu-se em algum lugar. Apenas vejo a tentativa de sobrevivência. Não chega ser um mar desconhecido, que ainda por cima me obriga a largar tudo, até a própria vida.

Arranca de mim, sem qualquer tipo de piedade toda a minha vida, todas as minhas paixões, tudo o que faz parte de mim. Arranca-me de mim mesma, e nem autorização pediu! 
E vejo pessoas a usar velas transparentes, e outras tecnologias para chegarem mais longe, mas eu não consigo eu apenas me tenho a mim (pelo menos aquilo que ainda não me tiraram).

Já não navego, apenas nado desesperadamente à procura de terra.


Boas navegações.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Dia 6827 de viagem, no barco.

Dia 6827 de viagem, no barco.

Precisava de partir para outro mar, num dos pequenos barcos salva-vidas navegar para outro lugar, sem tripulação para além de mim, sem exageros, sem coisas desnecessárias. Precisava, literalmente de um salva-vidas, que salvasse a minha, para que eu aprendesse a navegar e a viver outra vez. Precisava de respirar, e ter o meu espaço e tempo. Precisava de mudar, mudar na calma melodia do silêncio azul. 

Não entendo porque é que nós, seres humanos, nunca estamos satisfeitos com nada, nunca somos suficientemente felizes. Se temos algo queremos mais, como num ciclo infinitamente vicioso. Não nos contentamos com o que somos, nem com o que temos. Precisamos sempre de mais!

Paro de escrever, porque aquela dor voltou! Se calhar a solução é deixar um pouco a tripulação, ir navegar sozinha, sem ninguém saber para onde, nem como, nem porquê. E, talvez volte, é uma possibilidade. Ou talvez não venha a tempo de voltar. Provavelmente, melhor é ir, mas não num barco. Vou nadar no mar profundo, talvez lá me encontre. Sem barco, só eu e o meu corpo!

Mas como sei, na verdade, vou deixar-me ficar por aqui… no barco, sozinha, num dos pequenos cubículos, imaginando a vida fora do barco e pensando que seria bom se daqui sai-se… Mas não saio, nunca saio, só imagino.


Hoje, nem sei como me despedir….

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Dia 6820 de viagem, no mar, apenas.

Dia 6820 de viagem, no mar, apenas.

Serei a única marinheira que todos os dias pensa em escrever, pensa no que escrever, mas não tem tempo para o fazer? Não o consegue fazer? E Sente-se mal por isso? E fico perdida um pouco por não poder declarar por escrito tudo aquilo que penso. Sinto o caminho inseguro, não vejo tempestades grandes, que afectem o interior do barco, e estou resguardada por lá, mas com pouco tempo para o refugio, para a meditação. Sinto que tenho duas vidas e que as tenho de viver em simultâneo mesmo quando elas não se juntam. Sinto falta de uma e de outra, e o som entre elas é tão  distante e tão curto por vezes, ou um prolongamento de uma melodia, que apesar de percorrer os meus dias, ainda sou incapaz de a identificar, ou retratar. 
Preciso de ar para a tripulação, de tanta azafama por vezes, esquecemo-nos de respirar, de encher os pulmões de ar num movimento rápido, e deixarmos o ar sair levemente como um assobio que quase tenta repetir a tal melodia. O que fazemos aqui? Qual é o propósito da vida? Porque pensamos nós tanto no dia de amanha? Que na verdade nunca chega…. Porque pensamos tanto no dia de ontem? Que está eternamente acabado e não há nada que possamos fazer quanto a isso… E esquecemo-nos do simples acto de respirar, algo predominante na nossa vida… Respirar leva-nos ao presente, ao dia de hoje, a este minuto! Não tentem encher os pulmões de ar e viver toda a vida tentando que o ar não saia de lá! Tentando sufocar-vos a vos mesmo…. Respirem! Tanto ar à vossa volta e continuam sem respirar…. que mundo é este que vos obriga a não ver? a não sentir? Sao livres respirem da forma como quiserem, mas respirem e levem dentro dos pulmões os ventos de todas as vossas navegações.
Cumprimentos da vossa sempre marinheira,
Catarina


P.S. Hoje durante a viajem de comboio, fui na ultima carruagem, e vi a linha a escapar-me das mãos com uma velocidade louca, e tudo a ficar para trás…. Será que é assim que vivemos? O tempo não faz exactamente isso… escapa-nos das mãos!

sábado, 3 de janeiro de 2015

Dia 6802 de viagem, na dormência de quem sou

Dia 6802 de viagem, na dormência de quem sou

Devo pedir desculpas a todos os marinheiros, porque nem no Natal fui capaz de vos desejar um Feliz Natal como seria correcto, pelo menos eticamente. Por vezes é divicil vir e escrever, mesmo sem tema, escrever pela simplicidade de escrever, por vexes é divicil nesta vida apresada, ter tempo para escrever aquilo que a minha cabeça pensa todo o dia mesmo quando não devia. E por isso escrevo a estas horas, e não a horas habituais, ainda mal o dia começou e já estou eu a escrever supostamente sobre ele. Mas, hoje, o que eu escrevo não é apenas sobre o hoje é sobre uma espécie de nevoeiro estranho que sinto no barco. 
Sinto como se agora tivesse duas vidas em mim, estou num lugar e tenho saudades do outro, estando no outro tenho saudades do primeiro, Parece que mudo de barco enquanto viajo, uso barcos diferentes na travessia, a decoração é igual nos dois, mais a vida parece outra. E se penso no outro barco, entro como que numa dormência e um nevoeiro, feito de partículas estranhas com um cheiro indecifrável esvoaçasses em meu redor, e as unidas coisas que se lê por entre as confusos do lugar são: Quem sou eu? Onde estou? O que faço aqui?… Pergunto-m infinitamente quem eu sou realmente se uma das duas que sinto, se outra qualquer, parece haver um muro invisível que mesmo sem eu notar atravesso durante uma dormência de 3 ou 4 horas de viagem, e se vai repetindo como replicas de um sismo aleatoriamente.
Eu não consigo ser uma, como conseguirei ser duas? O ar que respiro é cada vez menos e o pensamento cada vez tem menos liberdade.

Prometo que mais tarde desenvolvo este tema mais profundamente, mas por enquanto Desejo apenas um bom dia marinheiros!